TOP 5-1 – One Shots Curtos

Existem muitas obras longas no mundo dos mangás. Não é estranho vermos séries que demoram anos ou até décadas para se concluírem. Mas por outro lado, também existem inúmeros one shots, histórias de capítulo único, que apresentam boas ideias em poucas páginas (alguns exemplos aqui) sendo mais acessíveis para todos os leitores, mesmo os mais descompromissados.

Essas obras podem ser lidas em poucos minutos e muitas vezes carregam mais qualidade e profundidade do que as obras enormes, principalmente quando investem em abordagens mais cômicas ou abstratas.

Aqui farei uma pequena lista com cinco exemplos, e um contraexemplo, de histórias curtas e analisarei-as brevemente. A regra é não passar de 15 páginas, sendo curtas até para os padrões dos one shots.

Pode se dizer que haverão spoilers, já que algumas obras são tão curtas que uma simples sinopse já poderia estragar a experiência. Portanto, recomendo que leiam os one shots citados antes de continuar.

5ª Posição – Angel’s Share (Oohinata Go e Takahashi Tsutomu – 8 páginas)

Um rapaz em um bar entre o céu e o inferno. A história é simples e direta, com uma espécie de plot twist no final. O mais interessante nesse one shot é a variedade. No tal bar, existem vários tipos de seres, todos visualmente únicos, com estilos de arte que não se encaixam, mas geram um contraste divertido.

Todo colorido, o desenho é o ponto central dessa pequena obra, como se tudo fosse apenas uma boa desculpa para testar estilos de pintura e design de personagem. Uma experiência bastante crua e bela.

A variedade também está nos diálogos, mostrando o protagonista como um homem amargurado pela sua morte, enquanto o garçom é um ser muito mais despreocupado e até desumano. No fim, os contrastes se mostram presentes até na temática da história, variando de um possível drama para uma surpresa sem sentido, mas muito divertida.

Não é uma obra profunda, porém ganha pontos nos contrastes e variações, entendendo-se como uma experiência simples e maluca.

4ª Posição – The Sad Tale of Principal Post (Junji Ito – 4 páginas)

Na primeira leitura, a história parece simplesmente maluca e sem sentido, por isso acaba sendo extremamente engraçada. Fica a dúvida, porém, se o humor é nonsense ou involuntário. Independente do humor, Junji Ito consegue criar mais uma de suas lendas urbanas.

O desenho, único dos cinco primeiros dessa lista que não é colorido, é o padrão do autor. Personagens com expressões exageradas em seu desespero e um contraste interessante entre o claro e agradável interior da casa e a escuridão embaixo dela.

Por tratar de uma situação muito surreal, a obra pede uma observação mais atenta para tentar entender se há em seu absurdo algo além da simples lenda urbana cômica. O que o conto parece tratar é o sacrifício do chefe de família para manter sua casa. Aquela bela e grandiosa residência não pode ser sustentada facilmente, em todos os sentidos, o que leva o pai da família a se tornar o pilar, carregar tudo nas costas e perder sua vida, simbolicamente e literalmente, apenas para manter a instituição familiar, representada pela casa, de pé.

Juntando horror, um humor deturpado e um possível tema social, temos boas páginas para serem lidas e relidas.

3ª Posição – Carogna (Mami Itou – 4 páginas)

Este one shot, devo dizer, é para maiores de idade. Obviamente, isso só faz adolescentes se interessarem mais ainda para ler este mangá. Se enganam, porém, aqueles que vão para esta obra procurando por algo excitante e sensual. Talvez seja se você tiver algum fetiche doentio e, nesse caso, recomendo um médico.

Carogna investe em uma trama mais subjetiva e dá ao leitor uma história simples, mas que pode ser profunda pelas possibilidades de interpretação. O desenho em si possui um estilo estranho, com expressões difíceis de serem compreendidas pela quantidade de emoções que passam, enquanto as amostras de violência são bastante cruas e desagradáveis (de novo, se você não for doentinho da cabeça). Os personagens e suas ações chegam a ser elegante em sua superfície, mas carregam uma essência podre e macabra.

Na minha interpretação, a história trata os desejos sujos e repugnantes das pessoas e porque essa falta de freio moral dos personagens abre um precedente para a caça e caçador se confundirem entre si. No momento em que o açougueiro trata as pessoas como carne, ele parece esquecer que é igual aos outros e pode ser visto da mesma maneira que vê suas vítimas. No fim da história, o ciclo recomeça e assim continuará, pois a essa liberdade sanguinária sempre será uma via de mão dupla.

A obra deve possuir várias interpretações interessantes por seu estilo abstrato. Estilo este que poderia ser melhor aproveitado caso não houvessem textos no one shot, já que eles se tornam detalhes sem muita utilidade durante a leitura. Uma obra estranha e que encontra seu charme exatamente nisso.

2ª Posição – Escape (Akira Toriyama – 5 páginas)

O autor de Dragon Ball, renomado por fazer boa aventura e boa comédia. Nesta história temos um pouco dos dois. A fuga agitada da protagonista sugere uma história intensa, mas somos surpreendido por uma leveza muito engraçada no final.

A arte é no estilo comum do Toriyama, tudo muito parecido com Dragon Ball, tendo o diferencial de ser todo colorido. A quadrinização cinematográfica e dinâmica cria toda a tensão necessária para inspirar o sentimento de urgência.

A piada final, porém, é o grande trunfo. É a surpresa que não vem de uma enganação, mas de uma indução. Muitas obras criam quebras de expectativa de maneira artificial, mas aqui a expectativa é gerada sutilmente, usando a disposição dos quadros e o ritmo para iludir. Quando a piada chega, há um sentimento autêntico de ter caminhado até a armadilha por nossas próprias pernas e terminamos rindo da pegadinha que caímos.

1ª Posição – City in the Sea (Sahara Mazaki – 12 páginas)

A primeira colocada é a mais longa e a única sem absolutamente nenhum diálogo. A história trata de um provável mundo pós-apocalíptico com uma cidade submersa onde vive uma garotinha.

O traço da obra não é muito rebuscado, parece um tanto amador demais e cumpre seu papel de maneira modesta, sem impressionar. As cores, porém, impressionam muito, até consertando os erros do traço e dando vida a tudo naquele mundo. É interessante notar que as palhetas diferem para cada momento da história, tomada pelo azul das águas nas primeiras páginas, exagerando no roxo na sala dos criminosos, cor esta que é geralmente associada à morte, fechando com um vermelho suave e um tom sépia clichê e eficiente para o flashback.

Sem diálogos, o visual conta essa linda história muito bem, deixando os sentimentos da protagonista claros como água. Histórias de infância perdidas em uma terra apocalíptica são relativamente comuns, mas aqui é feito de uma maneira muito simples, sem apelar para o drama exagerado. Uma personagem que não fala, mas nos mostra como é forte sem ser totalmente fria. Mesmo querendo ter sua vida antiga de volta, ela conseguiu aceitar e se adaptar ao novo mundo, sorrindo ao molhar sua mão nas águas do passado que não voltará.

Uma obra sensível e tocante, conseguindo dialogar com qualquer pessoa de maneira muito profunda apenas com traços e cores. A essência da arte sequencial.

Posição -1 – Yuuto no Shinro Kibou (Daiku Tomoko – 7 páginas)

Uma história que começa mostrando um estudante comum que se diz um herói, que sua família é feita de heróis e que ele deve vencer um tal Lorde Demônio. O mínimo que se espera é que seja uma piada, e daquelas bem nonsense. Só que não é pra esse caminho que o one shot vai.

A arte é bastante genérica, com personagens extremamente clichês em seus visuais e uma quadrinização que beira a preguiça com seus quadros primários. Nada no desenho é bem trabalhado, tudo parece normal demais.

A trama, que parecia uma comédia, surpreende quando foca no romance do tal herói com sua colega de sala. Eu aceitaria não discutir se a obra fosse cômica e o elemento do “herói” fosse uma piada, porém ele de fato é um herói e leva isso a sério. Mas o que é ser um herói, afinal? E porque um herói estaria na escola e na mesma classe que o (spoiler) Lorde Demônio?

Com um final piegas e sem peso, a história parece um amontoado de páginas de algum battle shonen clichê. Mas sem construir direito os personagens, as relações e os conflitos deles, a obra acaba tratando o pequeno número de páginas como inimigo e não como plataforma.

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Enfim, vimos que one shots curtos podem guardar histórias profundas e notamos que com poucas páginas os autores conseguem fazer obras inteiramente bem trabalhadas visualmente, inclusive colorindo-as por inteiro. Em uma lista como essa sempre falta alguma coisa muito boa, então complemente o post nos comentários!

3 comentários

  1. Sempre utilizo Escape quando surgem com esse papo de que Toriyama não é bom quadrinista. “City in the Sea” possui certas semelhanças com o também curto “Umi-chan’s Friends”, do Koji Kumeta, só que sem o tom provocativo e o formato de livro infantil.

    Um exemplo de minimalismo bem empregado — apesar de não ser mangá — é “La Orilla”, da Elisa Gálvez e do Frederico del Barrio. http://i.imgur.com/sm0O9ES.jpg

    Fora esse, não consigo lembrar de outros menores agora. Os mais próximos são “Boy’s Summer” (12 pgs.), dos anos sessenta, desenhado pelo Shinji Nagashima (se não me engano, um ex-assistente do Tezuka), que me cativou pela maneira com a qual a atmosfera é construída (do tipo pra ler enquanto escuta “Never Seen The Sea”, do Gavin Clark). http://mangadoom.co/boys-summer/0/2/

    … e “Fasting” (11 pgs.), baseado num trabalho do Kazuo Umezu, e, assim como o “The Sad Tale…” do Ito, é outro pequeno conto de horror com um comentário social embutido. http://imgur.com/a/F400R

    • Boas sugestões, não conhecia. O Boy’s Summer não me pegou tão bem, mas Fasting é um terror divertido mt bom e La Orilla é perfeitamente sutil, eu enquadraria e colocaria na parede. Umi Chan é surtado, mas ideia é agradável em sua bizarrice, eu leria 50 páginas disso fácil!

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