Corrente de Reviews: Sunadokei

Não, não é uma sessão nova no blog!

Idealizado pelo Didcart do Anikenkai, está rolando na blogosfera manganimística brasileira uma Corrente de Reviews, onde os blogs indicam um para o outro alguma obra a ser resenhada/criticada.

A corrente iniciou-se dia 25 de Julho com o próprio Anikenkai sugerindo Genshiken para o blog Across The Starlight. Este, por sua vez, indicou o anime Scrapped Princess para o blog Gyabbo!, que finalmente indicou um mangá para o Mangatologia; e a obra escolhida foi o shoujo Sunadokei.


(Clique nas imagens se quiser ampliá-las)

Primeiramente, para acompanhar as resenhas a serem feitas clique na imagem abaixo para ir até a página da Corrente, que listará todos as resenhas/críticas feitas.

Publicada de 2003 a 2006 na revista Betsucomi da editora Shogakukan, Sunadokei (em português, Ampulheta) é um shoujo de 10 volumes, que foi licenciado no Brasil pela Panini, tendo sua publicação já completa sob o título de Sunadokei – O Relógio de Areia. Infelizmente é um pouco difícil encontrar todos os volumes da Panini para compra, e portanto não consegui ler todos os 10 volumes para esta resenha. No entanto, tendo lido os 6 volumes que consegui encontrar, já é base mais do que o suficiente para julgar alguns aspectos da obra. Então, vamos lá.

Ann Uekusa, 26 anos, está arrumando suas malas para o seu casamento que se aproxima. Subitamente, ela encontra entre seus “tesouros” guardados uma antiga ampulheta. Essa ampulheta leva sua memória (e nós, leitores) a 14 anos no passado, no inverno dos 12 anos de Ann, onde a história do mangá começa.

Nessa época, após o divórcio de seus pais, Ann e sua mãe estão se mudando de Tokyo para Shimane, uma cidadezinha de interior onde mora a avó materna de Ann. Nesta nova cidade, ela precisará lidar com diversas situações e acontecimentos que moldarão a vida e a personalidade de Ann, como suas amizades, perdas e a descoberta do amor.

Além de Ann, outros três personagens de mesma idade são foco do enredo: Daigo, um jovem simples e direto porém gentil; Shiika, um ano mais nova, filha de família rica, é prestativa e popular entre os garotos; e Fuji, irmão mais velho de Shiika, que é o mais quieto e reservado de todos.

Sendo um shoujo, Sunadokei possui diversas características clássicas dessa demografia. Traços caricatos na maior parte do tempo (ficando sério só em quadros específicos), luzes e brilhos “mágicos” ao fundo de diversas cenas, disposições peculiares de quadros pela página, diversos pensamentos espalhados pelas páginas… Enfim, não quero entrar aqui no mérito de tais escolhas estéticas, porém pelas poucas obras que conheço do gênero, percebo que tais artifícios muitas vezes são usados apenas pelo apelo clássico e visual e não como uma ferramenta facilitadora de enredo. Kimi ni Todoke, por exemplo, peca no exagero dos pensamentos que pouco avançam a história.

Porém, de forma diferente, Sunadokei sabe utilizar-se bem desta estética e é uma agradável surpresa para alguém não familiar com outras obras dessa demografia. A autora Hinako Ashihara demonstra ter plena consciência do roteiro desejado, e utiliza-se de uma ótima velocidade de enredo para nos levar até o ponto idealizado desde o começo da obra. Portanto, esqueça as 12 páginas de uma personagem pensando e tentando entender o que é aquele sentimento que ela está sentindo; esqueça a página brilhante com poucos acontecimentos relevantes; com um avanço rápido da história, somos poupados dos longuíssimos dramas e pormenores dos acontecimentos para nos focarmos no que é relevante: nos fatos que fazem o roteiro avançar sempre.

Isso é muito interessante principalmente se considerarmos a relação íntima dos personagens da obra com o conceito de tempo, representado de forma eficaz pela ampulheta que dá nome ao mangá. Sunadokei conta diversas histórias e tramas ao mesmo tempo, todas elas interligadas através do relacionamento entre os personagens. Acontecimentos que queríamos reviver, decisões que gostaríamos de voltar atrás, momentos que queríamos que durassem para sempre; todos esses conceitos tão íntimos e comuns do ser humano estão presentes no enredo do mangá. E tristemente, assim como é na vida, o tempo jamais para, e o mundo continua girando contrário ao desejo dos personagens.

Talvez o grande mérito de Sunadokei seja a transposição para o papel de situações tão comuns da vida de cada um. Mesmo que você não tenha vivido exatamente o mesmo acontecimento que os personagens, a maioria das pessoas já passou pela perda de alguém muito querido, pela experiência mágica do primeiro amor e pelas decepções e problemas amorosos que surgem depois disso. E embora discorde da visão da autora que mostra o primeiro amor como “o verdadeiro grande amor”, acho ótima a forma como ela mostra todos os principais problemas de um relacionamento, principalmente entre duas pessoas muito jovens e inocentes, que tolamente imaginam que jamais conseguirão amar alguém com a mesma intensidade que o primeiro amor.

A história é contada de forma bastante rápida, com passagens grandes de tempo entre um capítulo e outro. Enquanto no primeiro volume saímos dos 12 anos de Ann, no volume 6 já estamos nos seus 18 anos, onde muita coisa já aconteceu. Essa opção da autora, além de ser bastante eficaz e direta, mostra o ótimo planejamento de enredo. No começo do primeiro capítulo, vemos uma personagem de 26 anos, e ao longo da obra vemos como a trama é construída para nos levar até aquela personagem que vemos no começo, mostrando o avanço passo a passo.

Aliás, os personagens são o ponto alto da trama. Extremamente críveis e humanos e sem nunca apelar para o melodrama exagerado, todos os personagens, dos principais aos coadjuvantes (a personalidade da vó de Ann, por exemplo, nos é apresentada tão naturalmente que parece que a conhecemos há anos) possuem uma personalidade construída e evoluída ao longo de toda a obra. Conseguimos ver por exemplo os reflexos dos acontecimentos da vida na personalidade que Ann apresenta ao longo da obra, de suas alegrias a suas melancolias.

Inclusive, como tudo que envolve o tema “amor”, o enredo é envolto por uma extrema melancolia. A leitura avança com um grande nó na garganta, e a torcida constante do leitor para que tudo dê certo na vida desses personagens que passamos a adorar ao longo da leitura. Isso provavelmente se dá por ser tão fácil nos identificarmos com o que eles passam, pois a autora cobre tantas formas e facetas do amor ao longo da obra que é quase impossível não termos vivido alguma delas. Amor à distância, amor não correspondido, amor platônico, amizade que vira amor, a perda de um amor… qualquer jovem que um dia se apaixonou já passou por alguma dessas situações, e é por retratar tão humanamente fiel tais situações que a obra ganha mais e mais força.

O traço da autora, embora não seja excepcional, é muito belo. Os personagens tem traços visuais bem definidos e característicos. Mas onde a autora brilha mesmo é nas montagens das fotos que acompanham a obra toda. Junto com a ampulheta, várias fotos tiradas pelos personagens ao longo da série vão pontuam os momentos relevantes do enredo; e essas mesmas fotos são desenhadas pela autora com a casualidade e com a importância que as fotos possuíam antigamente. Aliás, acho fantástico o contra ponto que autora traça entre a ampulheta, que representa o tempo que jamais para e que constante está dando voltas, e as fotos, que são os registros de um momento único na vida que jamais será repetido. A mesma melancolia e saudade que os personagens sentem ao ver as fotos do passado, nós leitores também sentimos, pois de fato estivemos lá, vivendo com eles esses momentos e lamentando o rumo que a vida toma.

Com um roteiro planejadíssimo, personagens identificáveis, traço competente, belas e tristes analogias, e diversas facetas do amor primorosamente executadas, Sunadokei torna-se uma feliz surpresa para alguém que não tem familiaridade com obras da demografia em questão. Para todo aquele que já viveu qualquer forma de amor, Sunadokei é uma obra que irá tocar seu coração e com certeza te deixará mais e mais ansioso a cada volume lido. Fico feliz que a “quebra da zona de conforto” proposta pela recomendação do Gyabbo tenha sido feita com uma obra tão incrível.

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E a corrente irá prosseguir com uma indicação para o blog Omnia Undique. Com um objetivo diferente da recomendação do Gyabbo, a nossa indicação é um convite a ler, analisar e dissertar sobre uma obra pouco conhecida e discutida. Portanto, foi indicado o mangá The Music of Marie.

Fiquem de olho e acompanhem o resto da corrente de reviews!

6 comentários

  1. Através da Corrente de Reviews estou conhecendo muitos blogs que não acompanhava, sejam eles resenhando obras que eu não conheço, e que entraram na fila de animes/mangás, e de obras que acompanhei com muito gosto.
    Sunadokei é um título que quero muito ter na estante, li poucos volumes, mas não pude comprar na época que estava nas bancas. Gosto de mangás Shonen e Shoujo, mas como bem falado no review essa é uma ótima obra para quem não está familiarizado com o gênero.
    O nível de reviews da Corrente está excelente, parabéns a todos os envolvidos.

  2. […] Cá estou novamente participando de uma Corrente de Reviews! No seu segundo ano, organizada novamente pelo Diogo do Anikenkai, o blog participa também pela segunda vez do evento. Ano passado eu havia sido sorteado pelo Gyabbo e precisei ler Sunadokei, como um desafio shoujo para este blog que tinha por costume (ainda tem) apenas falar sobre shonens e seinens. Foi uma experiência interessante que vocês podem ler aqui. […]

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