No último post eu comentei sobre adaptações. Falei sobre adaptações para mangá partindo de livros, filmes, animes originais, jogos, e tentei esboçar uma ideia geral de qual era a melhor forma de se fazer uma adaptação.
Neste post, procuro agora eleger no nosso clássico Top 5-1 quais são as 5 melhores (e a pior) adaptações para mangá de alguma história de outra mídia. Vamos ver com quantos vocês concordam…
5ª Posição – Shinobi no Kuni (Mutsumi Banno, baseado no livro homônimo de Ryo Wada)
Série de um autor novato, numa revista novata, de um livro desconhecido no ocidente. Esse é Shinobi no Kuni, a adaptação de mangá do livro que se passa no século XVI, no qual acompanhamos a história de diversos personagens envolvidos com a província de Iga, famosa por seus ninjas e que de fato existiu (e foi retratada diversas vezes em mangás, como em Basilisk). Porém o livro (e o mangá, consequentemente) não são relatos históricos; o enredo mistura fatos e personagens reais com acontecimentos e personagens fictícios, contando a trama da vila tentando se proteger de um inevitável ataque do exército de Oda Nobunaga (porém a ofensiva em questão é comandada pelo filho de Oda, que não tem nem um pouco do carisma, força e respeito do pai).
Para tal, os líderes da vila armam um enorme plano que envolverá todos os membros da própria vila e também diversos subordinados de Oda. A trama é complexa, com vários personagens importantes, relevantes e únicos, mas a figura central, que acompanhamos em boa parte do tempo, é Mumom (personagem da imagem), o melhor shinobi de Iga e que cobra caro por seus serviços, e tenta a todo custo satisfazer o desejo de sua esposa por dinheiro.
Shinobi no Kuni é publicado na Gessan, uma jovem antologia shonen mensal da Shogakukan, e atualmente conta com 4 volumes. Como dito na pequena explicação do enredo acima, ela possui uma história ampla em um universo que se expande em personagens únicos com características bem marcantes. Um dos pontos interessantes é que temos personagens centrais nos dois lados em conflito, e nenhum deles é mostrado como vilão, uma vez que cada lado tem interesses diferentes, e cabe a nós julgar quem está certo e quem está errado. E Mumom, o protagonista, é bastante divertido em sua rigidez e mau humor, distanciando-se do protagonista de Shonen padrão. Aliás, a própria história se distancia do shonen padrão, com um enredo bem montado, bem direcionado, com um traço mais “sujo“ (que eu acho bastante semelhante ao do Shiibashi, autor de Nurarihyon no Mago) e estilo de narrativa nem um pouco voltada pra quem lê a Shonen Sunday, por exemplo.
É um ótimo exemplo de adaptação ainda sendo feita e que por si só é uma história bem proveitosa.
4ª Posição – Summer Wars (Ikura Sugimoto, baseado no filme-anime homônimo dirigido por Mamoru Hosoda, com character design de Yoshiyuki Sadamoto)
Em um mangá de 3 volumes, temos uma adaptação não apressada e bem executada de um filme (animação). Summer Wars conta a história de Kenji Koiso, que é convidado pela garota pela qual é apaixonado (Natsuki) para fazer um trabalho nas férias de verão. Quando chega ao local, Kenji descobre se tratar de uma reunião da família de Natsuki pro aniversário de sua matriarca, e seu trabalho é fingir ser noivo de Natsuki. Durante essas férias, ele recebe no seu celular um enigma de matemática; ele, sendo um gênio da matemática, a resolve sem dificuldades… porém essa resolução se revelará a causa de um caos mundial, ocasionado por um ataque a maior rede social de informações do mundo. Agora cabe a Kenji e à família Jinnouchi tentar impedir o pior.
Acho interessante como o Summer Wars junta de maneira sensível e nem um pouco forçada os dramas de um relacionamento de uma família comum com os problemas do mundo todo. Para “salvar o mundo“, a família precisará primeiro resolver suas diferenças. E essa premissa é executada de maneira bastante agradável, e qualquer pessoa com um bom convívio familiar (sou de uma família grande e bastante unida também, sei como são reuniões familiares) consegue identificar algumas similaridades com sua vida. E a trama de “ataque mundial” está interligada de maneira tem completa com a outra trama que não há do que reclamar; e o bom tamanho da adaptação permitiu que nada fosse atropelado ou mal explicado, tendo o tamanho ideal.
Para uma pessoa que não viu o filme, o mangá por si só cumpre o papel de “valer a pena”, e portanto é uma outra ótima leitura. E o melhor é que já temos essa adaptação lançada no Brasil, completa, pela editora JBC.
3ª Posição – Omoide Emanon (Kenji Tsuruta, baseado nos contos de Shinji Kajio)
Originalmente um pequeno conto do autor de ficção-científica Shinji Kajio, lançado nos anos oitenta na revista SF Japan. A tradução do título é Memórias de Emanon, que conta acompanha um jovem apaixonado por ficção-científica que conhece num barco uma jovem que se apresenta como Emanon (o inverso de No Name). Essa garota afirma possuir a memória de todos seus antepassados, de mais ou menos 3 bilhões de anos.
Não posso me extender na explicação do enredo, uma vez que é um mangá de apenas 1 volume, e qualquer detalhe a mais estragaria a leitura. Aliás, talvez não estragasse, uma vez que só a belíssima arte do autor já justificaria a leitura, mesmo já conhecendo a história completa. A história de Omoide Emanon é bastante simples, ao mesmo ponto que é carregada de uma profundidade enorme. Sermos apresentados a um personagem tão único como Emanon é uma experiência bastante diferente, enriquecedora e satisfatória; personagens “imortais” não são tão incomuns na ficção de forma geral, mas nunca vi um personagem ser tão humanizado quanto Emanon é.
O mangá é uma leitura bastante leve e rápida, e é obrigatório para qualquer fã de mangás que queira expandir um pouco seus horizontes. Por fim, vale ressaltar dois pontos. Primeiro, para uma outra análise (mais profunda) sobre a obra, vejam a resenha do Judeu Ateu no blog; e segundo: o conto original fez bastante sucesso na época, e rapidamente se tornou uma série de histórias envolvendo esse personagem único. Assim, surgiu também um novo mangá, desenhado pelo mesmo autor, que apresenta outra história da personagem. Esse mangá chama-se Sasurai Emanon (algo como Devaneios de Emanon), e até o momento possui um volume traduzido; esse volume é mais curto que o convencional, no entanto é totalmente colorido, o que o torna outra leitura obrigatória, mas que deve ser lida depois de Omoide Emanon.
2ª Posição – Watashitachi no Shiawase na Jikan (Sumomo Yumeka, baseado no livro coreano de Ji-young Gong)
Um mangá de 1 volume da mesma autora da adaptação para mangá de Hoshi no Koe (que poderia facilmente despontar neste Top 5-1, mas que resolvi suprimir pra não ter um terço do Top com uma mesma autora), conta a história de dois personagens bastante distintos que se encontram. Ela, uma pianista famosa que abandonou a carreira e já tentou suicídio 3 vezes; ele, um assasino sentenciado à morte. Ambos se encontra no corredor da morte (ela visitando presos com a tia, ele detento) e… melhor não prosseguir na descrição, pois o mangá é curto e qualquer revelação pode diminuir um pouco o impacto da história. Basta dizer que é uma história bastante humana que lida com os nossos sentimentos e à nossa vontade de morrer e força para viver
Esse mangá não é um dos mais bem votados dos sites de mangás à toa; a história curta, porém tocante, é carregada de sentimentos tão fortes que qualquer pessoa sem dúvida se emocionará com o enredo. E o mais interessante é que ela não é um dramalhão; pelo contrário, é bastante contido e evita lugares comuns que muitos buscariam para chocar o leitor.
A história toda é carregada de uma grande felicidade, porém escondida abaixo de uma enorme camada de melancolia que cercam os dois personagens principais (e todos os personagens periféricos que aparecem ao longo do mangá). E todo a evolução do mangá se dá no tempo certo, num tamanho ideal, num formato que funcionou perfeitamente. E o belíssimo traço da autora só ajuda a história como um todo, transformando Watashitachi no Shiawase na Jikan em um dos melhores mangás que você lerá em toda a sua vida!
E assumo: ele só não está em primeiro por minhas preferências pessoais.
1ª Posição – Shiki (Ryu Fujisaki, baseado no livro homônimo de Fuyumi Ono)
Como um fã declarado do autor, dificilmente conseguiria fazer esse Top sem colocar Shiki numa alta posição. Esse mangá de 11 volumes, foi publicado na Jump SQ e é um exemplo de adaptação sem pressa e sem afobação que tanto comentei no post anterior.
No mangá, somos apresentados à pequena, aprazível, pacata e isolada vila de Sotoba, onde todo mundo conhece todo mundo. Esse vilarejo começa a ser assolado por mortes misteriosas, onde as pessoas adquirem uma forte anemia antes de morrerem alguns dias depois. Esses acontecimentos passaram a ocorrer após uma misteriosa família se mudar para uma mansão que existe na vila.
Os principais personagens da trama (não sei se dá pra chamar de protagonistas, uma vez que a vila em si é a protagonista da história) são Natsuno Yuki, um jovem que cresceu na cidade grande e agora quer de toda forma sair dessa cidade atrasada; e Toshi Ozaki, o único médico da cidade, que tenta entender o mistério por trás de tantas mortes. Além disso, existem diversos outros personagens periféricos que são tão importantes pra trama quanto esses. Posteriormente (é um pequeno spoiler, mas nada de tão grave) aprendemos que a causa das mortes são vampiros (na história, chamados de shikis) que começam a aumentar de número conforme mais e mais pessoas vão morrendo.
Eu já afirmei em podcasts diversas vezes que sou um fã do Ryu Fujisaki. A arte dele é maravilhosa; embora nem um pouco realista (os cabelos malucos dos personagens que o digam) no que diz respeito a character design, ela arrasa nas ilustrações de cenários, e nesse mangá ele pode trazer o seu melhor desenhando essa vila pacata cercada por montanhas e florestas. Além disso, ele possui um senso espacial maravilhoso, e mesmo com personagens não tão “reais“, conseguimos entender facilmente todas as dinâmicas de cenas propostas por ele.
Também é a primeira vez que o vemos num trabalho com pouquíssima comédia, e ainda assim, distante de seu local comum, ele consegue surpreender positivamente. O clima sombrio da história é envolvente, e somos levados a viver junto com os personagens naquela vila isolada, trazendo uma sensação quase claustrofóbica. E a forma com que o enredo é conduzido (aqui créditos pra autora do livro) é primoroso, com personagens pequenos crescendo quando é necessário, e uma coerência que beira o brilhantismo.
Shiki é uma ótima adaptação, um ótimo mangá de suspense, drama e horror, e uma recomendação fortíssima do autor deste blog.
Posição -1 – The World Ends With You (Shiro Amano, adaptado do jogo homônimo da Square Enix)
Enquanto montava esta lista, na minha mente estava como pior adaptação a de El Hazard, versão mangá de um anime que passou na Bandeirantes anos atrás. A adaptação é corrida, mal executada, confusa e pouco divertida. Mas ela não figura a posição -1 pois me lembrei de uma pérola (só que ao contrário) das adaptações de jogos para mangá.
Adianto primeiramente que The World Ends With You é o meu jogo preferido de DS, e o acho primoroso e muito divertido. Porém, após concluir o jogo, eu fui descobrir que haviam dois one-shots (ou um mangá de dois capítulos sequenciais) e procurei ler. Pior ideia que tive em anos.
Não vou entrar em detalhes do enredo; basta saber que o mangá tenta transportar para pouco mais de 30 páginas a história INTEIRA do jogo (que pra mim durou horas e horas). Foi uma péssima ideia; mau executado, quadrinhos confusos, péssima evolução, previsivelmente corrido, sem graça nas poucas cenas que tenta ser engraçado, com um traço mediano (tenta emular o traço do jogo, com pouca eficácia), uma conclusão inconclusiva e que não é nem um pouco proveitosa pra quem nunca jogou o jogo. É um exemplo máximo de adaptação feita na onda do sucesso de um jogo (e nem foi feita para vender, pois dois capítulos nem se encaderna, provavelmente foi feito pra promover o jogo para os leitores de mangá) e um exemplo máximo de uma merda fumegante atômica que eu desejo que mais pessoas leiam para odiar junto comigo.
É sério.
O manga de Summer Wars tem algumas mudanças que até o tornou melhor que o original. Por exemplo: Kenji é um pouco mais ativo e tem alguns momentos que dão um gostinho a mais na relação com a Natsuki. Ele a protegendo no final, a conversa no extra sobre escolha de universidade.
Nunca comprei os mangás de Summer Wars porque sabia que havia o filme e eu achava que seria uma daquelas adaptações repulsivas kkk Mas depois dessa resenha eu vou ver se ainda encontro nas bancas >_<
Deve ser relativamente fácil achar Summer Wars ainda, duvido que tenha vendido muito. Inclusive deve ser fácil achar com algum desconto. E vale bastante a pena.
Nem sabia que Emanon era baseado em alguma coisa, pra ver, quando você nem sabe que a obra é baseada em outra, quer dizer que ela já é boa por si própria, não precisa carregar o peso de ser uma adaptação. Bom momentum alias pra falar de Sasurai Emanon, muito lindo esse mangá.
Também gostei do mangá de Sumer Wars e isso que teoricamente o filme seria algo “impossível de se adaptar”, já que o maior destaque está na qualidade da animação. Mas mesmo ficou ótimo, no final das contas não tem essa, tudo depende.